Charge mostra o rosto de Charles Darwin em corpo de macaco
Reprodução
A confusão entre primatas, homens e macacos é tão antiga quanto a
própria Teoria da Evolução, de Charles Darwin. Embora muitas vezes ela
ocorra por falta de conhecimento científico, outras tantas ela é evocada
com o simples intuito de causar confusão e polêmica. Há casos também em
que a ideia é apenas ser racista mesmo, como no caso do torcedor que
jogou uma banana para o jogador Daniel Alves.
A campanha “Somos
todos macacos”, criada por uma agência de publicidade justamente para
que os jogadores de futebol respondessem aos repetidos casos de racismo
em campo, foi lançada, aparentemente, em defesa de uma boa causa. “Somos
todos iguais”, “não há diferença entre negros e brancos”, parecia
evocar o seu slogan, que foi imediatamente apropriado por várias
celebridades posando com bananas e replicado pelas mídias sociais.
Muita
gente, no entanto, logo protestou. “Somos todos humanos”, bradou a
colunista do GLOBO, Flávia Oliveira, em seu blog. “Eu não sou macaco”,
muitos contestaram nas redes sociais. E eles têm razão. E, não, não se
trata de uma filigrana.
Os homens e os macacos (chimpanzés,
orangotangos, gorilas e bonobos) são mamíferos pertencentes à ordem dos
primatas, que, por sinal, inclui ainda os lêmures. Somos, portanto,
todos primatas. Mas nem todos são macacos, alguns de nós somos humanos. E
há ainda os lêmures, não se esqueçam. A despeito das boas intenções da
campanha, argumentam muitos, quem sempre foi chamado de macaco da forma
mais pejorativa e racista possível, prefere não fazer eco à uma campanha
que pode acabar por confundir mais do que esclarecer.
Outra
coisa: homens tampouco descendem de macacos, como se costuma dizer por
ai, de forma equivocada. De acordo com a Teoria da Evolução de Charles
Darwin, homens e macacos compartilharam um ancestral comum em algum
momento de sua história evolutiva, por volta dos 6 ou 7 milhões de anos
atrás, a partir do qual foram se diferenciando.
Mas desde quando a
teoria de Darwin foi apresentada pela primeira vez, a provocação esteve
presente. “O senhor descende do macaco por parte de mãe ou de pai?”,
teria disparado o bispo Samuel Wilberforce para o biólogo Thomas Henry
Huxley, que apresentava as ideias de Darwin na Universidade de Oxford,
em 1860. Conhecido na época como “o buldogue de Darwin” (embora não
fosse um cachorro), Huxley teria rebatido: “preferia ser descendente de
um macaco que de um homem educado que usa sua cultura e eloquência a
serviço do preconceito e da mentira.”
O alvoroço provocado pela
teoria, na época, é explicado pelo fato de ela apresentar, pela primeira
vez, o homem como um animal qualquer, não um ser especial, e tirar o
papel divino da criação. Além disso, ela desmontou um dos principais
argumentos do racismo.
A relação de negros com macacos foi muito
utilizada no passado para, inclusive, justificar a escravidão. Tirar a
humanidade de uma pessoa (comparando-a a um animal) é uma forma clássica
de subjugá-la. Mais um bom motivo para bradarmos “somos todos humanos”,
não macacos.
Muito depois de Darwin, a genética veio corroborar
as suas ideias, mostrando que, a despeito dos fenótipos diferentes, não
há diferença entre os seres humanos. Somos todos iguais mesmo.
Geneticamente falando, nem mesmo o conceito de raça se sustenta. Não há
diferenças.
Já entre seres humanos e macacos há diferenças
genéticas, ainda que surpreendentemente pequenas. Homens e chimpanzés
compartilham cerca de 99% de seu material genético. Em relação aos
demais primates, o percentual é um pouco menor, mas, ainda assim,
bastante alto. Entretanto, nessa mínima diferença reside aquilo que nos
torna humanos: a capacidade de raciocínio, e, portanto, entre tantas
outras coisas, a de não sermos racistas.
------------------ Reportagem por Roberta Jansen (Email · Twitter)
Fonte: Jornal O Globo online, 01/05/2014
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