Uma substância 200 vezes mais forte que o aço, porém da
espessura de um átomo, está provocando uma "corrida do ouro" científica
no mundo todo, fazendo empresas e universidades saírem em disparada para
compreender, patentear e lucrar com esse "primo" do grafite comum de
lapiseira, porém mais fininho e fascinante. O material é o grafeno. Para demonstrar seu potencial, recentemente Andrea Ferrari
pegou uma fina folha de plástico transparente, dobrou-a e pressionou
teclas invisíveis, fazendo soar notas musicais num tom metálico.
A reportagem é de Gautam Naik, publicada no jornal The Wall Street Journal e reproduzida pelo jornal Valor, 02-09-2013.
O teclado, fabricado no laboratório de Ferrari, na
Universidade de Cambridge, tinha circuitos impressos de grafeno, que é
tão maleável que os cientistas preveem que vai realizar o sonho de
produzir telefones flexíveis e jornais eletrônicos que podem ser
dobrados e caber no bolso.
É o material mais fino que se conhece, mas é extremamente forte, leve e flexível.
Tem uma capacidade excepcional de conduzir eletricidade e calor e de
absorver e emitir luz. Os cientistas isolaram o grafeno há apenas uma
década, mas algumas empresas já estão elaborando produtos com ele. Este
ano, a Head NV lançou uma raquete de tênis infundida com grafeno. A Apple Inc., a Saab AB e a Lockheed Martin Corp. já pediram ou receberam patentes para usá-lo.
"O grafeno é um tipo de material, como o aço, plástico ou silício, que pode realmente transformar a sociedade", diz Ferrari,
que chefia um grupo de cerca de 40 pesquisadores de grafeno na
Universidade de Cambridge. Mas o grafeno também enfrenta desafios.
É ainda muito caro para o mercado de massa, não serve para uso em alguns circuitos de chips
de computador e os cientistas ainda procuram maneiras melhores de
transformá- lo numa forma utilizável. "A tecnologia do grafeno é
complicada", diz Quentin Tannock, presidente da Cambridge Intellectual Property,
empresa de pesquisas do Reino Unido. "A disputa para encontrar valor
[no grafeno] é mais uma maratona do que uma corrida de velocidade", diz.
O interesse pelo grafeno explodiu em 2010, quando dois pesquisadores ganharam o Prêmio Nobel
por conseguir isolálo. Cientistas acadêmicos e de empresas estão agora
correndo para patentear uma ampla variedade de possíveis utilizações.
A Apple pediu uma patente para "dissipadores de calor" de grafeno para dispositivos móveis. A Saab pediu uma patente para circuitos de aquecimento de grafeno para degelar as asas dos aviões. A Lockheed Martin
conseguiu uma patente para uma membrana de grafeno que filtra o sal da
água do mar por meio de poros microscópicos. Outras empresas já pediram
patentes para utilização de grafeno em chips de computador, baterias,
telas de toque flexíveis, revestimentos antiferrugem, pneus e
dispositivos para sequenciamento de DNA.
Um grupo de cientistas da Grã-Bretanha usou uma membrana de grafeno
para destilar vodca. Em maio, havia 9.218 pedidos para patentes de
grafeno publicados e apresentados, cumulativamente, no mundo - uma alta
de 19% ante o ano anterior, segundo a Cambridge Intellectual.
Nos últimos cinco anos, segundo a entidade, o número acumulado de
pedidos de patentes para grafeno mais que quintuplicou. A maior
esperança para o grafeno no curto prazo está na eletrônica de alta
velocidade e em circuitos flexíveis como o do teclado de Ferrari, devido à demanda esperada para uso em telas eletrônicas flexíveis. Empresas como a sul-coreana Samsung Electronics Co. e a finlandesa Nokia Corp.
pediram patentes para diversas utilizações do grafeno em dispositivos
móveis. Uma das áreas mais promissoras é a tinta de grafeno, usada para
fabricar circuitos impressos, que algumas empresas já começaram a
vender.
A BASF SE está experimentando a tinta de grafeno
para imprimir circuitos flexíveis dentro de estofamentos, capazes de
aquecer o assento dos carros - tecnologia que, segundo a empresa, pode
chegar ao mercado em poucos anos. O grafeno tem, de fato, apenas duas
dimensões, numa estrutura microscópica que parece um arame. Num estudo
publicado há cinco anos, pesquisadores da Universidade de Columbia
concluíram que era o material mais forte já medido.
Eles calcularam que seria preciso um elefante equilibrado em cima de
um lápis para perfurar uma folha de grafeno da espessura do filme
plástico usado para embalar alimentos. Os circuitos de grafeno prometem
ser, futuramente, mais baratos do que outros materiais condutores como o
cobre e a prata, pois pode ser feito a partir do grafite - um material
abundante, que se vê nos lápis comuns - e também pode ser criado pela
combinação de certos gases e metais ou sintetizado a partir de materiais
sólidos de carbono.
Alguns fornecedores dos Estados Unidos estão vendendo uma camada de
grafeno sobre uma película de cobre de 2,5 centímetros quadrados por US$
60. "O preço precisa ficar em torno de US$ 1 para cada polegada
quadrada para aplicações sofisticadas de eletrônica, como transistores
rápidos, e menos de US$ 0,10 para cada polegada quadrada para telas de
toque", estima Kenneth Teo, diretor da divisão de Cambridge da alemã Aixtron SE, que fabrica máquinas para produzir grafeno.
O material tem outra desvantagem significativa: não pode ser transformado facilmente em um interruptor. A International Business Machines Corp. ficou inicialmente otimista quanto ao uso do grafeno em chips de computador,
mas descobriu que nesse material os elétrons se movem rápido demais
para serem desligados com facilidade, dificultando transformar a
corrente elétrica nos "uns" e "zeros" do código digital. Laboratórios ao
redor do mundo estão tentando resolver o problema. Mas, por enquanto,
"não vemos o grafeno substituindo o silício nos microprocessadores", diz
Supratik Guha, diretor de ciências físicas na divisão de pesquisa da IBM, acrescentando que continua a ser um grande defensor do material.
A IBM já pediu várias patentes de grafeno. O grafeno
pode ter o mesmo destino de outros materiais muito alardeados que não
conseguiram atender às expectativas. A descoberta de supercondutores de
alta temperatura valeu um o Prêmio Nobel
em 1987 e levou a uma enxurrada de patentes e previsões de novas
tecnologias. O mundo continua à espera. Mesmo assim, ainda há muito
entusiasmo científico. Em 2012, cientistas publicaram 45% mais trabalhos
sobre o grafeno do que em 2011, segundo a Thomson Reuters Web of Science,
um índice de revistas científicas. A corrida é global: até maio, foram
as entidades chinesas que pediram, cumulativamente, o maior número de
patentes para aplicações, seguidas pelas americanas e sul-coreanas,
segundo a Cambridge Intellectual. A Samsung apresentou a maioria dos pedidos, seguida pela IBM. Algumas patentes já encontraram o caminho para produtos que já estão no mercado.
A Vorbeck Materials Corp., dos EUA,
fabrica uma tinta de grafeno que, segundo a empresa, está sendo usada
para imprimir circuitos em embalagens antifurto em algumas lojas
americanas. A Bluestone Global Tech Ltd., outra empresa novata dos EUA, fabrica folhas de grafeno que, segundo ela, vende para clientes nos EUA,
China e Cingapura. "Dentro de meio ano, o grafeno será usado para telas
sensíveis ao toque em celulares à venda no mercado", prevê Chung-Ping Lai, seu diretor-presidente.
A descoberta do grafeno também levou os cientistas a procurar muitos
outros materiais bidimensionais com propriedades incomuns, diz Andre Geim, da Universidade de Manchester, no Reino Unido, cientista nascido na Rússia que em 2010 ganhou o Prêmio Nobel de Física com seu colega Konstantin Novoselov, por seu trabalho com o grafeno. "O grafeno abriu um mundo material que nós nem sabíamos que existia", diz Geim.
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Fonte: IHU on line, 03/09/2013
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