Mons. Bruno Forte*
Uma reflexão de Mons. Bruno Forte sobre o "Vatileaks" e a altura espiritual de Bento XVI
A publicação de algumas cartas privadas de Bento XVI (na sua maioria
cartas privadas, dirigidas a ele), em um livro de fácil sucesso
editorial, representa uma queda muito séria, em termos de ética, da
comunicação. Nesta operação jornalística o respeito devido a cada pessoa
não foi nem um pouco tomado em consideração, especialmente aquele
devido à pessoa do Papa e daquelas pessoas que com confiança e senso de
responsabilidade lhe escreviam. Se o objetivo era fazer que a comunidade
eclesial, no seu centro universal, a Cúria Romana, aparecesse como uma
espécie de "ninho de víboras", desacreditando assim a mesma autoridade
moral da Igreja Católica, parece que falhou inteiramente: e isso
especialmente no âmbito do povo de Deus, onde querendo mostrar o
Sucessor de Pedro numa condição de fragilidade e de solidão despertou
para com ele uma onda de afeto e carinho na oração em proporções
impressionantes. As manifestações de carinho dirigidas ao Papa por
milhões de pessoas presentes na Missa celebrada no aeroporto de Bresso
em Milão por ocasião do VII Encontro Mundial das Famílias, há duas
semanas, como os muitos sinais de devoção e de afeto que estão
aumentando nas Igrejas locais de todo o mundo, são uma prova.
Até mesmo protagonistas da cultura "secular" e da vida pública têm mostrado a sua justa indignação em face dessa exploração mediática da "privacidade" de muitos, em primeiro lugar, daquela referência moral e espiritual altíssima que é para todo o mundo Bento XVI. O que é mais doloroso nesta história toda é a figura do chamado "corvo", isto é, daqueles que por causa dessas cartas sairam à luz, fazendo-os sair da confidencialidade que lhes era devido: tratou-se de uma grave traição da confiança recebida, de um ato moralmente repreensível no mais alto grau. Além disso, a comunidade dos discípulos de Cristo está acostumada à traição desde os seus inícios, a partir do drama de Judas e daquelas infames "trinta moedas" que - manchadas de sangue - foram consideradas adequadas apenas para comprar um campo de mortos para os estrangeiros. No entanto, nesta história emerge um estraordinário aspecto positivo, ligado ao testemunho mais do que bilhante e fidedigno de Bento XVI, de fé verdadeiramente rochosa. Prova disso são as palavras pronunciadas pelo Papa na audiência da quarta-feira passada na Sala Nervi no Vaticano,
que merece mais do que nunca uma reflexão: o contexto era o da reflexão sobre a oração, "oásis de paz em que podemos tirar a água que alimenta a nossa vida espiritual e transforma a nossa existência”. O modelo proposto pelo Papa foi o apóstolo Paulo, que em um momento de grande sofrimento "por três vezes orou fervorosamente ao Senhor para remover esta prova". E é nesta situação que, na contemplação profunda de Deus, recebe resposta ao seu apelo: "Te basta a minha graça; a minha força se manifesta na fraqueza” (2 Coríntios 12, 9). A lógica do Apóstolo é simples: ele "não se vangloria de suas ações, mas da atividade de Cristo que age justamente na sua fraqueza". Comenta Bento XVI: "Esta atitude de profunda humildade e confiança no manifestar-se de Deus é fundamental também para a nossa oração e para a nossa vida, para a nossa relação com Deus e com as nossas fraquezas... Paulo compreende com clareza como afrontar e viver cada evento, sobretudo o sofrimento, a dificuldade, a perseguição: no momento em que se experimenta a própria fraqueza, manifesta-se a potência de Deus, que não abandona, não deixa só, mas se torna o sustento e força”.
Aqui segue uma declaração marcante do Papa, na qual parece manifestar algo do seu sofrimento com discrição e modéstia: "Claro, Paulo teria preferido ser libertado deste sofrimento; mas Deus diz: Não, isso é necessário para ti. Terás as graças suficientes para resistir e para fazer tudo o que precisa ser feito. Isso também vale para nós. O Senhor não nos liberta dos males, mas nos ajuda a amadurecer nos sofrimentos, nas dificuldades, nas perseguições... Não é o poder dos nossos recursos, das nossas virtudes, das nossas capacidades que realiza o Reino de Deus, mas é Deus que obra maravilhas através da nossa fraqueza, da nossa insuficiência com a posição ocupada. Devemos, portanto, ter a humildade de não confiar apenas em nós mesmos, mas trabalhar, com a ajuda do Senhor, na vinha do Senhor, confiando-nos a Ele como frágeis vasos de barro”.
Transparece aqui o testemunho do homem de fé, que sabe muito bem o quão importante seja "a constância, a fidelidade do relacionamento com Deus, especialmente nas situações de aridez, de dificuldades, de sofrimento, de aparente ausência de Deus”. E isso é fruto de um grande amor: "Somente quando estamos agarrados ao amor de Cristo, seremos capazes de enfrentar qualquer adversidade como Paulo, convencidos de que tudo podemos Naquele que nos fortalece”. Justo assim, à sombra da miséria do acontecimento “Vatican Leaks” se eleva a grandeza da estatura espiritual deste Papa, que se torna uma mensagem de vida e de esperança para todos nós: diante das provas da vida e da história, principalmente daquelas que nos chegam tanto de forma inesperadas, quanto de forma dolorosas, daquelas morais como físicas (como os dramáticos acontecimentos do recente terremoto na Emilia), diante da crise ética que está na raiz das dificuldades de hoje na "aldeia global" é necessário acima de tudo manter alta a confiança na força do bem, na capacidade da verdade de vencer ao final, e a serena certeza – vivíssima em quem crê – de não estarmos sozinhos, mas de contarmos com a fidelidade de um amor que nunca falhará e que sustentará nas tempestades a barca da Igreja e de quem confiar no Deus vivo em uma rota segura, em direção a um porto de justiça e de paz para todos.
[Traduzido do italiano por Thácio Siqueira]
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* Artigo de opinião de Mons. Bruno Forte, arcebispo da diocese de Chieti-Vasto (Abruzzo), publicado ontem, domingo, 17 de junho, no diário Il Sole 24 horas.
Fonte: ROMA, segunda-feira, 18 de junho de 2012 (ZENIT.org)
Até mesmo protagonistas da cultura "secular" e da vida pública têm mostrado a sua justa indignação em face dessa exploração mediática da "privacidade" de muitos, em primeiro lugar, daquela referência moral e espiritual altíssima que é para todo o mundo Bento XVI. O que é mais doloroso nesta história toda é a figura do chamado "corvo", isto é, daqueles que por causa dessas cartas sairam à luz, fazendo-os sair da confidencialidade que lhes era devido: tratou-se de uma grave traição da confiança recebida, de um ato moralmente repreensível no mais alto grau. Além disso, a comunidade dos discípulos de Cristo está acostumada à traição desde os seus inícios, a partir do drama de Judas e daquelas infames "trinta moedas" que - manchadas de sangue - foram consideradas adequadas apenas para comprar um campo de mortos para os estrangeiros. No entanto, nesta história emerge um estraordinário aspecto positivo, ligado ao testemunho mais do que bilhante e fidedigno de Bento XVI, de fé verdadeiramente rochosa. Prova disso são as palavras pronunciadas pelo Papa na audiência da quarta-feira passada na Sala Nervi no Vaticano,
que merece mais do que nunca uma reflexão: o contexto era o da reflexão sobre a oração, "oásis de paz em que podemos tirar a água que alimenta a nossa vida espiritual e transforma a nossa existência”. O modelo proposto pelo Papa foi o apóstolo Paulo, que em um momento de grande sofrimento "por três vezes orou fervorosamente ao Senhor para remover esta prova". E é nesta situação que, na contemplação profunda de Deus, recebe resposta ao seu apelo: "Te basta a minha graça; a minha força se manifesta na fraqueza” (2 Coríntios 12, 9). A lógica do Apóstolo é simples: ele "não se vangloria de suas ações, mas da atividade de Cristo que age justamente na sua fraqueza". Comenta Bento XVI: "Esta atitude de profunda humildade e confiança no manifestar-se de Deus é fundamental também para a nossa oração e para a nossa vida, para a nossa relação com Deus e com as nossas fraquezas... Paulo compreende com clareza como afrontar e viver cada evento, sobretudo o sofrimento, a dificuldade, a perseguição: no momento em que se experimenta a própria fraqueza, manifesta-se a potência de Deus, que não abandona, não deixa só, mas se torna o sustento e força”.
Aqui segue uma declaração marcante do Papa, na qual parece manifestar algo do seu sofrimento com discrição e modéstia: "Claro, Paulo teria preferido ser libertado deste sofrimento; mas Deus diz: Não, isso é necessário para ti. Terás as graças suficientes para resistir e para fazer tudo o que precisa ser feito. Isso também vale para nós. O Senhor não nos liberta dos males, mas nos ajuda a amadurecer nos sofrimentos, nas dificuldades, nas perseguições... Não é o poder dos nossos recursos, das nossas virtudes, das nossas capacidades que realiza o Reino de Deus, mas é Deus que obra maravilhas através da nossa fraqueza, da nossa insuficiência com a posição ocupada. Devemos, portanto, ter a humildade de não confiar apenas em nós mesmos, mas trabalhar, com a ajuda do Senhor, na vinha do Senhor, confiando-nos a Ele como frágeis vasos de barro”.
Transparece aqui o testemunho do homem de fé, que sabe muito bem o quão importante seja "a constância, a fidelidade do relacionamento com Deus, especialmente nas situações de aridez, de dificuldades, de sofrimento, de aparente ausência de Deus”. E isso é fruto de um grande amor: "Somente quando estamos agarrados ao amor de Cristo, seremos capazes de enfrentar qualquer adversidade como Paulo, convencidos de que tudo podemos Naquele que nos fortalece”. Justo assim, à sombra da miséria do acontecimento “Vatican Leaks” se eleva a grandeza da estatura espiritual deste Papa, que se torna uma mensagem de vida e de esperança para todos nós: diante das provas da vida e da história, principalmente daquelas que nos chegam tanto de forma inesperadas, quanto de forma dolorosas, daquelas morais como físicas (como os dramáticos acontecimentos do recente terremoto na Emilia), diante da crise ética que está na raiz das dificuldades de hoje na "aldeia global" é necessário acima de tudo manter alta a confiança na força do bem, na capacidade da verdade de vencer ao final, e a serena certeza – vivíssima em quem crê – de não estarmos sozinhos, mas de contarmos com a fidelidade de um amor que nunca falhará e que sustentará nas tempestades a barca da Igreja e de quem confiar no Deus vivo em uma rota segura, em direção a um porto de justiça e de paz para todos.
[Traduzido do italiano por Thácio Siqueira]
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* Artigo de opinião de Mons. Bruno Forte, arcebispo da diocese de Chieti-Vasto (Abruzzo), publicado ontem, domingo, 17 de junho, no diário Il Sole 24 horas.
Fonte: ROMA, segunda-feira, 18 de junho de 2012 (ZENIT.org)
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