Frei Betto*
Candidato, vocábulo que deriva de cândido, puro, íntegro. Quem dera a
maioria correspondesse a essa etimologia… A ingenuidade de muitos
candidatos a vereador se desfaz quando, convidado a concorrer às
eleições, acredita que, se eleito, não será “como os outros” (quantos
não disseram isso no passado e hoje…) e prestará excelente serviço ao
município.
O que poucos candidatos desconfiam é que servem de escada para a
vitória eleitoral de políticos que eles criticam. Para se eleger
vereador, deputado estadual ou federal, é preciso obter quociente
eleitoral – aqui reside o pulo do gato.
A Câmara Municipal comporta de 9 a 55 vereadores, de acordo com a
população do município. Cândidos eleitores imaginam que são empossados
os candidatos que recebem mais votos. Ledo engano. João pode ser eleito
ainda que receba menos votos do que Maria. Basta o partido do João
atingir o quociente eleitoral.
Vamos supor que o município tenha 6.000 eleitores. Destes, 1.500
deixaram de votar, votaram em branco ou anularam o voto. São
considerados válidos, portanto, 4.500 votos. Como a Câmara Municipal tem
9 vagas, divide-se o número de votos válidos pelo número de vagas. O
resultado dá o quociente eleitoral: 500 votos. Todo candidato que
obtiver nas urnas 500 votos ou mais, será eleito vereador.
É muito difícil um único candidato obter, sozinho, votos suficientes
para preencher o quociente eleitoral. Casos como o do Tiririca são
raros. A Justiça Eleitoral soma os votos de todos os candidatos do mesmo
partido, mais os votos dados apenas ao partido, sem indicação de
candidato.
A cada 500 votos que o partido recebeu, o candidato mais votado vira
vereador. Se o partido obteve 1.500 votos, ele terá, na Câmara
Municipal, três vereadores. Os demais candidatos, que individualmente
receberam menos votos do que os três empossados, ficam como suplentes. E
o partido que obtiver menos de 500 votos, neste exemplo, não faz nenhum
vereador.
A lei permite que um partido apresente um número de candidatos até
uma vez e meia o número de vagas na Câmara. Se o partido se coliga com
outros partidos, a coligação pode apresentar candidatos em número duas
vezes superior à quantidade de vereadores que o município comporta. Para
uma Câmara que comporta 9 vereadores, cada partido pode ter 14
candidatos, e cada coligação, 18. Esta a razão pela qual os partidos
lançam muitos candidatos. Quanto mais votos os candidatos obtêm, mais
chance tem o partido, ou a coligação, de atingir o quociente eleitoral.
E, portanto, de eleger os candidatos com maior votação individual.
Ora, se você pensa em ser candidato, fique de olho. Pode ser que
esteja servindo de degrau para a ascensão de candidatos cuja prática
política você condena, como a falta de ética. Enquanto não houver
reforma política, o sistema eleitoral funciona assim: muitos novos
candidatos reelegem os mesmos políticos de sempre!
Se você é, como eu, apenas eleitor, saiba que escolher o partido é
mais importante que escolher o candidato. Votar de olho somente no
candidato pode resultar, caso ele não seja eleito, na eleição de outro
candidato do partido. Como alerta o sociólogo Pedro Ribeiro de Oliveira,
“mais frequente, porém, é a derrota e a frustração de pessoas
bem-intencionadas, mas desinformadas. Ao se apresentarem como
candidatas, elas mobilizam familiares, amigos e vizinhos para a
campanha. Terminadas as eleições, percebem que sua votação só serviu
para engordar o quociente eleitoral do partido ou da coligação…
Descobrem, tarde demais, que eram apenas ‘candidatos alavancas’”.
Convém ter presente que o nosso voto vai, primeiro, para o partido e, depois, para o candidato.
São raríssimos casos como o da manicure Sirlei Brisida, eleita
vereadora em Medianeira (PR) com apenas 1 voto. Seu partido, o PPS,
concorreu nas eleições de 2008 com nove candidatos. Pelo quociente
eleitoral, apenas Edir Moreira tomou posse. E se mudou para o PSDB,
acompanhado pelos outros sete suplentes. Sirlei, que adoeceu durante a
campanha eleitoral, e não pediu votos nem à família, permaneceu filiada
ao PPS. Agora, a Justiça Eleitoral decidiu que o mandato pertence ao
partido, no caso, ao PPS. Edir foi cassado e Sirlei, empossada.
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* Frei Betto é escritor, autor de “A mosca azul – reflexão sobre o poder” (Rocco), entre outros livros. www.freibetto.org – Twitter:@freibetto.
Fonte: http://mercadoetico.terra.com.br/12/06/2012
Imagem da Internet
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