Menalton Braff*
Até
o fim desta crônica, vocês, os que até lá persistirem, vão descobrir
por que me sinto, ao escrevê-la, verdadeiro soldado do exército de
Brancaleone, o que, de certa forma, posso adiantar, significa alguma
coisa próxima de não estar na moda. Sei que não estou na moda. Há muito
tempo já não me preocupam muito as opiniões, sobretudo da maioria. E
isso não me tem causado remorso algum. Além de meu amigo Adamastor,
pouca gente ousaria acusar-me por tal gosto de caráter antidemocrático.
Antes de continuar, contudo, e para que não me confundam os
propósitos, devo declarar com certa ênfase que meu nome não é Policarpo
Quaresma, não me julgo um nacionalista ingênuo nem pretendo apresentar
projeto propondo o tupi-guarani como língua oficial do Brasil.
O caso que me tem espantado, ultimamente, é a constatação de que
nomes como João, Maria, Pedro, Paulo, Alice e outros, desta lista de
bons e antigos nomes com que nossos antepassados batizavam seus filhos,
foram seqüestrados e já não fazem parte do acervo onomástico popular.
Eram nomes que não dignificavam ninguém, que nome não existe para isso,
mas que encaixavam com suavidade em nossos ouvidos. Às vezes até com
doçura. Em seu lugar, descubro (ainda não sei se me descrevo angustiado,
indignado ou penalizado) que os nomes da moda, pelo menos aqui, onde
moro, são Maicon, Greice Kelly, Tcharles, Djony e outros, muitos outros,
do mesmo jaez. Convenhamos que, mesmo fonicamente, os nomes antigos dão
de dez a zero (para usar expressão da moda, por ser futebolística)
nessas canhestras adaptações de nomes de bárbaras procedências. A moda,
nem por ser moda, deixa, muitas vezes, de ser ridícula.
Se o caso, entretanto, fosse apenas de moda, mesmo que de gosto
discutível, me parece que não seria caso de maior gravidade. Há algo de
insidioso por trás de tudo isso, me dizem as antenas já meio calejadas.
Então ouço, agora estarrecido, a história de uma professora. Sua
filha adolescente insistiu com a mãe para que fossem à loja comprar uma
blusa que, dizia a filha, estava na moda. Chegando lá, esta digna e
entristecida mestra, descobriu que a tal blusa estampava a bandeira dos
EUA. Chamou a filha a um canto e lhe disse com a aspereza que o caso
requeria: – Essa aí, não. Minha casa não vai sofrer invasão nem
desembarque de marines. Bandeira, no doce aconchego de nosso lar, só
existe lugar para uma: a nossa.
A filha chorou, esperneou, calou.
Consultada, a balconista confirmou que sim, que existiam blusas com a
bandeira brasileira, mas que não tinham saída, pois não estavam na
moda. Mesmo assim, sem estarem na moda, a indignada mãe comprou uma,
correspondente ao manequim da filha, que se recusou à prova.
Hoje, a inconformada professora diz que a blusa está lá, jogada em um
fundo de gaveta, aguardando alguma Copa do Mundo, quando poderá,
talvez, ter alguma serventia.
Contei a história a meu amigo Adamastor, um aforista, que sentenciou: – Colonizado feliz é a pior merda.
---------------------------
* Ex-professor, é contista, romancista (com 18 obras publicadas) e cronista.
Fonte: http://www.cartacapital.com.br/cultura/o-exercito-de-brancaleone/?autor=958
Imagem da Internet
Nenhum comentário:
Postar um comentário